sábado, 13 de dezembro de 2008

Divagações sobre a mídia

O texto abaixo é de autoria de Cláudio Lembo, advogado e professor universitário que foi vice-governador do Estado de São Paulo de 2003 a março de 2006, quando assumiu como governador. As divagações foram publicadas na Folha de S. Paulo do dia 2 de dezembro. No conteúdo, verdades óbvias para uns e para outros nem tanto, outras já renovadas. Mas, ainda assim, verdades. Aqui, apenas uma ressalva: trocaria o termo "formadores da opinião pública" por "servidores da opinião pública". Acho que dizer que nós a formamos é nos colocar num patamar talvez mais alto do que devemos, a depender do sentido apreendido do termo.

Todas as profissões produzem desgastes emocionais. Os níveis podem ser diversos. Mas, a inevitabilidade do cansaço pelo diuturno dos atos profissionais é uma constante.

A previsão bíblica contém carga absoluta de certeza, quando aponta para o suor advindo do trabalho. Este não é apenas físico. Acima de tudo, ele se apresenta como psicológico.

Entre as profissões, como uma das mais desgastantes, coloca-se o jornalismo. A busca diária de notícias ou a elaboração cotidiana de opinião leva o profissional à excessiva sensibilidade.

Não pode errar. Deve sempre oferecer seu produto com clareza, perfeição e conteúdo veraz. O jornalista, em sua intermediação entre as fontes e a sociedade, torna-se fundamental agente de formação da opinião pública.

Sem jornalismo deixa de existir a possibilidade de a sociedade conhecer os atos de seus governantes e assim avaliá-los para decidir nos momentos eleitorais.

Sem jornalismo é inviável a possibilidade da existência de uma efetiva democracia. Jornalismo e democracia são partes inseparáveis de uma mesma visão do mundo: a democrática.

Esta cosmo visão possui como principal elemento a garantia da plena liberdade. Só a liberdade permite um jornalismo isento. A liberdade é, pois, a condição indispensável para uma verdadeira democracia.

As ponderações contêm verdades axiomáticas. Ou, em linguagem mais direta, verdades acacianas. Apontam o óbvio. No entanto, coisas conhecidas merecem sempre ser lembradas.

Particularmente, em momento em que os meios de comunicação se ampliam - especialmente pelo surgimento da internet - e formam-se conglomerados empresariais na área da informação.

As exigências econômicas levaram ao aparecimento das grandes grupos de mídia. Já não se cobre a aldeia natal. Agora, a cobertura estende-se à aldeia planetária. Os acontecimentos, em toda a parte, merecem cobertura.

Surge o primeiro risco. A concentração dos meios de comunicação já não permite pensamentos plurais. Ingressa-se no perigoso cenário do pensamento único.

Este pensamento único não possui os mesmos elementos do existente nos regimes totalitários. Nestes últimos desejava-se endeusar o líder. Transformar mero mortal em deus vivo.

Agora, deforma a toda a realidade. Apresenta apenas uma única versão do acontecido. A mais pragmática e de acordo com as vontades dos núcleos centrais do poder político ou econômico.

Aqui um paradoxismo. Chocam-se, por vezes, a opinião pública com as fontes jornalísticas. Ou seja, os formadores da opinião pública - os jornalistas - ficam em posição antagônica aos destinatários de suas mensagens.

A constatação não se suporta em meras reflexões subjetivas. É também obtida em determinadas amostras de opinião colhidas junto à sociedade. As respostas levam a perplexidade.

Em determinadas situações, ocorre relação de amor e ódio entre a sociedade e os formadores de sua opinião. Uma rejeição racionalmente inexplicável.

Apresenta-se como episódio freudiano. O destinatário sente fragilidade em sua condição de destinatário da informação. Considera-se diminuído perante quem parece tudo saber.

O jornal La Repubblica publicou em seu site o resultado de pesquisa de opinião realizada na Itália. Surpreendente o resultado. Os números geram inúmeras reflexões e maior número de ponderações.

A pesquisa foi produzida pela Universidade Estatal de Milão. Aponta: 68% dos italianos consideram seus jornalistas mentirosos. Outros 60% acham-nos incompetentes e para 52% dos mesmos italianos os seus jornalistas não são independentes.

Prosseguem os números colhidos: 64% dos entrevistados consideram os jornalistas italianos aéticos. Ainda 52% acham que os seus jornalistas não têm respeito pelos outros.

Paradoxalmente, há grande desejo de mais informações por parte da sociedade italiana, o que levará ao maior crescimento dos meios de comunicação não tradicionais, segundo o mesmo levantamento de opinião.

Um comentário:

  1. eu acho que o melhor termo seria 'fomentadores', não servidores ou formadores. o primeiro é subserviente demais, ingênuo, até. parece que há um povo soberano para o qual o jornalismo humildemente presta seus serviços (e todo muito, exceto Lula, sabe que não é assim); nem formadores, afinal, pois não é menos ingenuidade achar que o povo é como a peça de mármore a se deixar esculpir (q bonito isso soou...)

    Bjs,
    G2

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